quarta-feira, 1 de março de 2017

Hoje eu preciso falar com você de qualquer jeito, não importa a hora, não importa o sono, não importa como...
A rotina tem me engolido nos últimos dias, a vida não me dá refresco e, sinceramente, eu nem quero. Quanto mais trabalho, menos eu preciso pensar...
Faz 12 dias que me viro entre os cuidados com a Júlia, afazeres da casa e visitas ao nosso pequeno... quando, enfim, paro é tarde da noite, mas minha cabeça continua, meu coração dói, sangra de saudades de você, aperta por não poder passar a noite ao lado de nosso filho...
Ele é pequeno, ele sofre, mas é guerreiro, é insistente, é forte, determinado e teimoso. Veio como um raio de luz, espantando a escuridão do meu peito, mostrando que eu preciso lutar e tenho pelo que lutar. Ele veio por mim, talvez guiado por você... quando eu o toco, é como se eu tocasse uma parte de você, quando ele abre os olhos, lutando contra a sedação, eu vejo você tentando me dizer algo... o mesmo acontece com Júlia. Agora mesmo, enquanto eu a cobria, lembrei-me de puxar a manga da blusa para tampar os bracinhos... eu fazia isso com você, lembra? Você sentia frio nos braços e orelhas... lembro-me muito de você no inverno passado dormindo de capuz, essa cena me vem sempre à memória... me faz sorrir, me faz voltar no tempo, me faz olhar para o lado para me certificar que você não está de fato... não encontro seus pés... sinto falta de suas mãos... procuro-as e, graças a Deus, encontro as de Juju. Nossa filha tem sido minha salvação nesses dias e noites difíceis... Bruninho tem sido minha esperança, meu recomeço.
Hoje, indo para o hospital à noite, olhei para o céu e vi a lua, mágica, uma pintura. Pensei em você na hora, queria que você a tivesse visto, é assim com tudo bonito que vejo ou ouço... quero compartilhar com você...
infelizmente, coisas tristes acontecem e nessas horas eu também quero compartilhar, te pedir ajuda, colo, abraço, um aperto na mão... lembra-se daquele casal que se olhava apaixonado, cúmplices enquanto seguravam as mãozinhas da filha na incubadora? Eu não os vejo mais, talvez nunca mais os verei. A incubadora está vazia, o anjinho Angélica não resistiu à prematuridade, se foi, fez a viagem cedo demais para quem fica... talvez ela tenha feito 1 mês de vida... eu gostaria de abraçar esses pais, dizer que sinto muito, oferecer meu ombro, mas é tarde demais...
A vida é assim, passamos muito tempo dizendo que nos preocupamos com os outros, mas fazemos muito pouco para provar isso. Eu aprendi que quando de fato amamos alguém, fazemos o impossível para estar presente. Dizer que se importa, pedir notícias de vez em quando não é se importar de fato...
Amar é cuidar, estar perto,   se mostrar importante, se fazer necessário, comprar briga... isso tudo mesmo sem a pessoa precisar, sem pedir.
O triste da vida é perceber que a maioria só se faz presente ou quer se fazer presente depois das tragédias , das mortes... aí não importa mais... o amor demonstrado só depois que partimos é nulo, não é amor, mas culpa. É preciso amar enquanto há vida...
Eu sigo te amando porque você é minha vida, você vive em mim e nos nossos filhos! Vivo muitas culpas, mas não a de não ter te amado, cuidado e me feito presente na sua vida quando era necessário, quando importava.
Hoje, vivo das melhores lembranças que quem ama de verdade constrói: desde um brigadeiro de colher a viagens, jantares e namoro preguiçoso nos dias de frio e chuva... não importa como ou onde, nossas lembranças são todas de muito amor e cumplicidade...
Eu vivo também de sonhos, sonhos acordados, daqueles cujo pensamento voa sem pressa... sonhos involuntários daqueles que te roubam a noite e te fazem construir lembranças como se tivessem sido reais... sonhos dos outros... muitas pessoas me contam de sonhos que tiveram contigo... o último foi da minha irmã. Nele, você estava abraçado a mim, segurando minha cintura, mas eu não podia vê-lo. Minha irmã gritava dizendo que você voltara, e você sorria, feliz... eu te procurava... sonhos assim me transmitem força, esperança de que você me ouve, me lê, me acompanha...
Interessante como eu não me sinto só. Os olhares curiosos daqueles que me veem entrar e sair de uma Uti neonatal sempre sozinha não me incomodam. Muitos devem se perguntar cadê o pai, o marido? Pobrezinha... abandonada...
A verdade é que eu sinto sua presença ao meu lado, o tempo todo. Não me sinto sozinha... não estou sozinha, tem amor no meu peito, tem história, tem a certeza de que um dia nossa família vai estar toda reunida, completa e feliz.
Te amo, meu bem... penso tanto em você, vida minha... que o universo conspire a nosso favor e me traga sonhos felizes com nossa família reunida...

2 comentários:

  1. Amém! Nossa Lê quantas coisas você tem nos ensinado! Sua dor, sua saudade, sua lucidez estão revelando tantas coisas importantes sobre nossa vida! Eu continuo em oração por você e pelo Bruninho e se eu pudesse já teria ido até vocês, mas eu sei que minhas preces também te acompanham! Grande abraço!

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